segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Passageiro

Déni era e não era um cavalheiro quixotesco,
Não tinha cavalo nem escudo,
Mas sonhava,
Manuseava rifles,
Voava na imensidão,
Atirava sem compaixão,
Defendia sem restrições,
Amava o selvagem de si,
O selvagem do outro;
Déni era livre,
Civilizado,
Incivilizado para datas,
Não queria compromisso com nenhuma Dorotéia,
Ou qualquer título de nobreza,
Ou dotes fabulosos;
Mas Déni amava fábulas,
Para ele os bichos eram melhores que gente,
Porque não tinham incertezas,
Somente eram certas as suas predestinações,
E a fala no olhar era mais palavra neles,
E os sons que emitiam tinham o ritmo para o momento exato;
Déni sabia que não era eterno,
Devia gostar dos contratos de prazo certo,
Mas odiava todos,
Fadados que eram aos limites do tempo,
Aos interesses do tempo,
Às posses descomedidas,
Às incertezas do poder e do amor;
Déni era passageiro...
E não comemorava datas...

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Renovadora

Não existe mais Sapateiro. Agora passa lá na Renovadora de Calçados! Tem até orçamento sem compromisso. Serviço profissional para quem quer dar uma ‘garibada’ naquele calçadinho meio batido, mas que ainda dá um caldo, quer dizer, uns passos. O material é o mesmo do sapateiro; tem sola, preguinho, martelo, cola; tudo do mesmo jeitinho, só que agora é na renovadora de calçados. Na rua principal do bairro tem duas, com placa em letras garrafais e tudo, que sapateiro é coisa de outro tempo. Agora é o tempo das renovadoras de toda sorte, um apelo moderno para o antigo e batido sapateiro que precisa de um nome mais comprido e que não diga respeito a ele em especial, mas à renovadora de calçados. Ninguém mais quer ir ao João Sapateiro, mas sim à renovadora de calçados. Que negócio é esse de arrumar o sapato? Não, não e não. Na renovadora seu sapato sai renovado, praticamente novo, que sapato velho, usado, é coisa de outro tempo.