segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Face em tato

Ela percebera-se sem face. Subitamente seus sentidos ,manifestos nos traços, decaiam e se rebelavam contra qualquer expressão bem vista ou mal vista. Era uma involução de qualquer comportamento expresso, como se uma maldição a rondasse; a ausência de face. Os cheiros a sumir no nariz diminuto; os gostos a se perderem na boca invertida, fechada pro mundo; a música dos instrumentos e das vozes a bater em ouvidos de orifícios colabados; a visão, dada a parcas sombras, como alcolizada. Só o tato vigorava, na sua ânsia desesperada por sentir o som da superfície, como a buscar qualquer profundidade. Suas mãos eram como sanguessugas a sorver sangue, suores, ou qualquer outra fluidez que denotasse vida. E toda aquela transformação de perda, era um ganho de sentir a escultura da vida em reentrâncias de encanto e assombro; solos úmidos e arenosos; peles em paz e desatino. Seu corpo também se avolumava de tantas impressões em registro no tato, que gritavam na alma de um rosto sem face. Depois, a face não importava tanto, senão os terminais nervosos de seus membros superiores que pareciam agora ouvir, cheirar, falar, ver. Sua face reapareceu na forma de mãos. Toda sua face era uma mão em apego, em chamado, do dito em movimento, do gesto que a face escondia.

Nenhum comentário: