Histórias sempre estão na fronteira; por mais que tentemos acomodá-las elas esbarram no real vivido, ouvido, lembrado; elas esbarram no imaginado, sonhado, criado...por isso evocamos os entrelugares, onde cabem o contraditório, o surpreendente e até o esperado...todos eles permissíveis à intromissão do eu e também à sua ausência, mesmo disfarçada.
domingo, 7 de julho de 2013
Vrum Vrum Vrum
Ela realmente não sabia por que insistia em ir àquela praça, onde crianças giravam em torno daquela fonte circular, sem uma gota de água. O que deveria ser um espaço público a serviço da contemplação e do bate papo e das brincadeiras improvisadas, como pique esconde, futebolzinho com bola de qualquer material, dera lugar a um amontoado de parafernálias motorizadas a fazer simulações para tempos futuros, os giros nas rotatórias...vrum, vrum, vrum...e aquelas crianças iam já com olhar e postura de adultos nos seus dispositivos móveis imóveis, sem falar uns com os outros, apenas a rodar e rodar em torno da fonte sem água...Dessa vez ela levara um livro, com a clara intenção de não se angustiar com os giros intermináveis e vruns vruns, mas não havia como não vê-los, ouvi-los...Das primeiras vezes foi bem pior; sentiu um embrulho no estômago, um certo enjoo matutino pela brincadeira precoce, pelo desenlace com o mundo natural, das corridas pelos pés, das cambalhotas, dos cochichos e risadas, das mãos dadas fora dos volantes dos vruns vruns...mas os vruns vruns já haviam tomado a alma da fonte, secado a fonte, fixaram-se na praça...Ela não sabia quando ela, a fonte, secara; se algum jorro já se soltara dali, ou se a água fugira do vrum vrum vrum das pequenas motonetas...
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