terça-feira, 25 de maio de 2010

Mais tanto

Certa vez disseram a ela: 'eu te amo'. Ela duvidou desse amor e nunca soube se era mesmo amor ou vontade de amor, posto que o amor acabou. Continuou para sempre na dúvida dessa expressão tão corriqueira entre os enamorados. ‘Eu te amo’ virou expressão de incerteza. Preferia gosto tanto, quero-te bem demais, se possível acompanhados de reticências multiplicadas; enfim, qualquer palavra que julgasse mais amena seguida de outra enfática. Não sabia por que exato tinha tanto pudor desse corriqueiro dizer do amor, mas achava as outras formas mais sinceras, como se entre as palavras, uma a carregar a outra, houvesse um tempo de pensar, de refletir o sentir. Entre amigos sinceros achava a expressão definitiva ‘eu te’ mais ‘amo’ plenamente justificável, pois que via nela, nessa sintaxe de aproximação eu te, algo muito perto da amizade; desse diálogo, amor entre amigos, acalento. Mas do amor enamorado, sujeito ao apego exagerado do corpo, sorriam-lhe as reuniões de pedaços como a descrever com fôlego um sentimento sem descrição, misto de corpo e mente, fadado a desequilíbrios constates, como se o corpo buscasse a mente e a mente o corpo, e esses dois se digladiassem até o fatal. Não adiantava; tinha birra do ‘eu te amo’ e acusava-o de fingido porque viu tanto amor declarado assim se desfazer como um desencanto, sem dizer algum entre ‘eu e te’. Bom mesmo, ela pensava, era enamorar amigo; ‘eu te’ então soaria laço por amor de dizer amor e sentir amor, não apenas o lapso habitual dos enamorados prestes a se soltarem diante do definitivo ‘eu te amo’. Para ela, o ‘eu te amo’ penalizava qualquer ato falho, qualquer deslize ou inconstância; virava expressão falseada, impulsiva, não sentida, quase banal. Mas no fundo ela queria ter coragem de dizer ‘eu te amo', mas ‘eu te amo’ sentido como tanto.

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