segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

'Impaladar'

O passar das horas era-lhe cada vez mais ’impalatável’. Ficava aquele sobejo sem gosto na boca e sobre os dentes uma camada oleosa enjoativa a impermeabilizar outros sabores vindouros. Vinha só esse ‘impaladar’ do tempo de palatabilidade espúria. Porque o tempo era ido e vindo; não dava tempo pro eu pensamento e pro seu despertar de sabores. As papilas da língua doíam, não se conformavam com o costume dos gostos, e perdiam aquela habilidade surpreendente de amar o doce, o salgado, as bases, os ácidos e até os amargos. Era urgente aquele tempo de gosto, gostar do tempo, mastigá-lo delicadamente e engoli-lo cheio de saliva, mas a sua oralidade secava, não havia palavra boa no tempo. O tempo declinava da boca, do sabor na boca, da alma da boca.

2 comentários:

Nina Blue disse...

Keila, me lembrei da maravilhosa e crocante mil folhas que a minha boca se deliciava na feirinha de Teresópolis, anos atrás...

Luciano disse...

Que belo espaço tu tens aqui, em palavras, imagens e sons. Gostei, parabéns.