quarta-feira, 16 de março de 2011

Fome de ar

Ela lutava para encontrar uma paz que fosse no redemoinho em que se enredara. Ela lutava, enquanto as perguntas sem respostas se multiplicavam, enquanto a ausência se instalava silenciosa ao olhar de qualquer um que fosse. Ela lutava nessa imperceptível luta solitária, sobre a qual ninguém sabia, ninguém perguntava; ninguém poderia, em verdade, perguntar sob risco eminente de se frustar diante de respostas tão evasivas, desorientadas. Ela parecia que não lutava, mas seu coração saltava sem saída dentro do peito, chocava-se com seu frágil tórax, que aos poucos ia se fechando para a atmosfera cheia de miasmas, partículas indecifráveis, incapazes de aplacar sua fome de ar. A densidade era tanta e pouca; faltava e transbordava a densidade. Então o ar não se segurava; ele escapava enquanto seu peito multiplicava as contrações, ainda que em disfarce de face. A fome de ar era de sentir a claridade do mundo, a razão do mundo. Nada poderia ser tão dolorido como a fome de ar. Ela lembrava-se da gata Potira no instante de morte, de sua fome de ar a arfar pela vida. Lembrava-se que nada pôde fazer, enquanto os olhos saltados de Potira imploravam por um pouco de ar.

4 comentários:

Valeria Soares disse...

Muito bom!!!!

Adoro passar por aqui.

Saco de Bagulhos disse...

Ei!! Gostei daqui!! Voltarei sempre. Beijo

kell disse...

Oi Keila,
Obrigada pela visita, espero que volte mais vezes.

Adoro divagar por Entrelugares outros, espaços de pensamentos soltos e de sensibilidade literária associada ao ser intelectual. E a despeito das insistentes fronteiras entre isso ou acolá, limitadas e que insistem em delimitar, eis que entrelugares se recusam a deixar-se dominar, e seguem em fluxo inconsciente e descontínuo, seguem por ar, terra e mar, sempre a vagar

Nina Blue disse...

Fome de ar ou fome de voar pelos ares da vida?
Linda metáfora!