Histórias sempre estão na fronteira; por mais que tentemos acomodá-las elas esbarram no real vivido, ouvido, lembrado; elas esbarram no imaginado, sonhado, criado...por isso evocamos os entrelugares, onde cabem o contraditório, o surpreendente e até o esperado...todos eles permissíveis à intromissão do eu e também à sua ausência, mesmo disfarçada.
sábado, 11 de outubro de 2014
Grito
Decididamente não era um bom vivã. Esquecera-se de deixar de remoer fatos que agora só restavam na memória. Não havia repercussão alguma deles, senão as reprimendas que fazia a si próprio por ter figurado naquele cenário de circo; as silhuetas flutuantes, as palavras amáveis, os rostos curiosos, a bebida na medida do sonho. Agora adentrava seu quarto a avistara pela entrada do banheiro aqueles ladrilhos de parede. As mulheres se repetiam com sombras e traços indeterminados; retratos nos ladrilhos. Cada uma delas, uma boca em grito; um só olho e nada de narinas. A visão era baça, assimétrica, metades irreconhecíveis de qualquer coisa. O cheiros sumiam até dos perfumes. Por certo teriam perdido o nasal naqueles sucessivos espirros. A boca gritava fundo pra dentro, pra fora; e o grito não saía dos ladrilhos, sufocava.
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