quinta-feira, 23 de abril de 2015

Encantado

Não há melhor ideia para descrever a morte do que o encantamento de Rosa. Lembrara agora do seu pai preto que fora sem alarde em um boteco da avenida abaixo da casa dela. Silencioso até na despedida, pediu uma água e nem chegou a beber, pois já estava repleto. Viveu na simplicidade do fazer das mãos. Para tudo tinha um pensamento de conserto numa paciência que chegava irritar. Só muito mais tarde ela percebera o valor daquela calma; apenas uma forma de chegar na sua solução, porque não dava a mínima para as soluções rápidas dos outros. Cambaleava feito um copo que simula cair e não cai. Achava a vida boa e insistia nessa cantiga e no fazer impossível sempre possível. As mãos eram grandes e não encaixavam nos pequenos parafusos e canos submersos, mas ele esgueirava os dedos pacientemente até encaixar e desimpedir os caminhos. Ele foi silencioso feito alguém que não vai. Ficou encantado.

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