Histórias sempre estão na fronteira; por mais que tentemos acomodá-las elas esbarram no real vivido, ouvido, lembrado; elas esbarram no imaginado, sonhado, criado...por isso evocamos os entrelugares, onde cabem o contraditório, o surpreendente e até o esperado...todos eles permissíveis à intromissão do eu e também à sua ausência, mesmo disfarçada.
terça-feira, 7 de abril de 2009
A moça, o florista e o mendigo
A chuva descia copiosa e escorria pelo toldo da schin, bem na porta do casarão da seresta, na esquina da praça. A moça, o florista e o mendigo se encontraram lá debaixo; um na expectativa do lanche prometido pelo funcionário da casa de materiais de construção; os outros somente na contingência do tempo cinzento e chorão. Enquanto a água caía ao montes chegou o pastel de carne moída e o café quente; ‘cuidado, tá quente demais, não vai queimar a boca.’ E a carne do pastel escapava pelos intervalos de dentes, pela ansiedade do alimento, e caía no chão, e o café descia quente mesmo pela goela ressecada. A moça se virava só em meio círculo, reticente, sem saber se comovia-se com a cena da refeição partida perdida pela debilidade dos membros do mendigo, ou se entrava logo e molhava toda feito criança do sertão em chuva morna, quase ouro do céu. E o florista? Esse tinha calma; sabia que algumas pétalas não resistiriam aos arroubos do vento e da tempestade. Esperava o destino do tempo.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário