segunda-feira, 20 de abril de 2009

Repetidor Barthiniano

O amor se repetia. Vinha de todas formas, só aparentemente diferentes, mas iguais e repletas de todos os sentimentos cabíveis e incabíveis. O amor se repetia tanto que cansava. Porém, chegava disfarçado de novo, de expectativas nobres, de desejos incontidos, de toques descomedidos. Era sempre na epiderme que ele se mirava, no intervalo de pêlos sobre a pele e até nos mesmos pêlos prestes a cair, ou serenamente cortados, sem dor. Mirava-se nas células superficiais, frágeis, farelos. O amor tinha algo de descamação, de substituição provável e inevitável, porque tinha fissura pelo objeto da perda, pelas unhas endurecidas enraizadas na carne, prestes a serem separadas do corpo. O amor ia somente pra vir de novo, na sua pretensa e ilusória originalidade. Era assim; ele, o amor, tinha apego pelas partes sobrepostas que denotavam vida em constante renovação, inconstante. Era o amor pelo amor, não pelo objeto amado. O objeto era vário, mas a curiosidade se renovava exatamente naquele objeto, acusado de conter o amor, apenas por ser improvável; a vida se desfazendo; os fragmentos de epiderme, a causa do desejado amor. O amor se repetia na multiplicação celular, no advento da vida, prenúncio da morte. O amor era atento justamente nas partes que se perdiam no objeto, nos fios de cabelos, nos nacos de unhas, nos pêlos nascidos imponentes, mas arrancados facilmente. O amor se repetia no tom da cantiga da epiderme, insurgente, multiplicadora, mortífera...o amor pele e discurso se repetia como antídoto da vida.

Nenhum comentário: