terça-feira, 2 de setembro de 2014

Deusa

A escrita vinha num fluxo irreprimível...Se não deixava correr rio, a memória não segurava as palavras que viriam; elas, as palavras se distraíam; já não eram as mesmas; os encaixes com os sentimentos e pensamentos se perdiam. O que vinha era assim impreciso, parecia um registro do passado focado no presente futuro. Assim, toda vez que se colocava em escrita, cada instante era único, irrepetível; as palavras e conexões jamais seriam encontradas novamente daquela forma, e talvez a onda psicanalítica, o deslanchar de sentimentos se contivesse nesse mesmo momento pra renascer não sei onde, de um jeito imprevisto. Por isso mesmo, impressionava a ela a capacidade da memória e sua amplitude de descrição ao sabor das particularidades do tempo; bastava um segundo e o dito já era outro e os detalhes já não eram os mesmos. Os registros, por certo, eram volúveis, embora a memória permanecesse intacta nas suas múltiplas potencialidades. Tudo está contido nela, mas só fatias são recuperadas de tempos em tempos...incompletudes...A escrita então era sempre essa parca tentativa de ser memória, a deusa memória.

Um comentário:

Balão D'Ar disse...

Gostei muito, parabéns :)