Histórias sempre estão na fronteira; por mais que tentemos acomodá-las elas esbarram no real vivido, ouvido, lembrado; elas esbarram no imaginado, sonhado, criado...por isso evocamos os entrelugares, onde cabem o contraditório, o surpreendente e até o esperado...todos eles permissíveis à intromissão do eu e também à sua ausência, mesmo disfarçada.
quinta-feira, 12 de junho de 2014
Assassinatos
Ela tinha que assassinar seus sentimentos dia após dia como fossem matérias. Ela tinha que torná-los perfeitamente conformados, objetos desprezíveis nesse mundo banal. Ela tinha que esquecê-los por mais que fossem intensos, matá-los na mente e no coração, e fazer sorrisos pra alguém ver, pra ninguém ver. Morte e sorriso rimavam sem rimar, no mundo feito dessas matérias fortes e superficiais. Lembrava-lhe a mão com aquele segmento de pele a descamar, epitélio suicídio, linfocítico, guerra de dentro pra fora, guerra deflagrada sem saber, auto guerra, bombardeios imunológicos. Lembrava-lhe toda fragilidade da alma revelada no corpo, porque não conseguia de fato ver desumanidade. Mas sentia-se desumanizada, um pedaço de carne sem alma. A morte dos sentimentos vinha assim, dia após dia nas matanças diárias dos sentidos, dos cuidados, dos afetos nascentes.
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