Histórias sempre estão na fronteira; por mais que tentemos acomodá-las elas esbarram no real vivido, ouvido, lembrado; elas esbarram no imaginado, sonhado, criado...por isso evocamos os entrelugares, onde cabem o contraditório, o surpreendente e até o esperado...todos eles permissíveis à intromissão do eu e também à sua ausência, mesmo disfarçada.
quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008
Biquinho
Desde o dia em que experimentara a primeira vez gostara. Aquele ardor adocicado feito aperitivo, estalado e molhado a inundar toda boca. O biquinho vinha assim naturalmente como sinal de quero mais ou, então, em um ansioso apertar, para não perder o gosto. Foi quando surgiu a boa nova: Clarisse ia ter um pé em casa. Sua mãe havia preparado um canteiro bastante adubado, que já tinha dado alface e almeirão, verdes e macios. A couve é que nunca foi essas coisas; criava mofo antes de crescer, ficava ‘engruviada’ como dizia dona Ruth. Agora o pé de pimenta biquinho; esse fez história naquela casa e em outras também. As colheitas se sucediam após repetidas floradas; branquinhas e pequeninas, as florzinhas iam ficando graciosamente avermelhadas e atrevidas; faziam bicos de todos os tamanhos e foram parar na mesa de toda a família. Cada colheita para Ruth e Clarisse era como se fosse a última. Não era uma ‘biquinho’ qualquer, tinha ares de biquinho, mas personalidade de malagueta. Todos se encantaram com a pimenta biquinho de Ruth, e se encabulavam com uma produtividade tão duradoura; até que um dia o pé de biquinho começou a ‘engruviar’. Agora, todos esperam as pimentas dos brotinhos daquele primeiro pé; fazem encomendas e torcida para que o gosto seja doce e ardido, deliciosamente intrigante como das primeiras ‘biquinhos’.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
3 comentários:
tipo, criei hoje meu blog e tava dando uma olhada nos dos outros.. (¬¬ foi mals), entao vi o seu texto e gostei. foi você quem fez mesmo?
muito bom! parabens!
quitute da comida mineira esse trem..permitiu com seu teor democrático o deliciar da pimenta por qualquer um. Só temos mesmo que agradecer!
Isso aí Keilota, muito legal. Cada vez mais poética e lírica. Êta ferro...
Leo Coelho
Postar um comentário