terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Interessada e Modesto

Modesto passava horas em frente à televisão, assistindo novelas e futebol. Lucimara não suportava mais a "paredeza" e sua "falta de interesse" por tudo. O casal se conheceu em um desses barzinhos com música ao vivo. Começaram o flerte, a conversa, os amassos, até que decidiram dormir juntos. Desto se mudou definitivamente para a casa de Luci. Ela achava mesmo que Modesto era o pior que ela conhecera em se tratando de homens, mas com o tempo as coisas foram se ajeitando, e a apatia do companheiro acabou por se tornar um desafio para ela. Tudo parecia entrar nos eixos. E após seu casamento fracassado, Lucimara achava mesmo que devia ter modéstia.

Mulher esbelta, de corpo rijo, bem torneado, falante e "interessada", Lucimara começou a desenvolver uma antipatia incontrolável por Modesto. Era sempre assim: chegava em casa depois de um cansativo dia de trabalho e encontrava o homem lá, estirado no sofá, absorto na telinha, nas tramas novelescas e naqueles homens chutando bola. - Vamos ao teatro? - ela perguntava. Modesto não movia sequer uma parte do corpo, só levantava suavemente as pálpebras, indeciso, desanimado.

– Eu faço tantas coisas, dizia certa vez Luci a sua amiga Consola. Iam juntas no coletivo lotado e Lucimara desabafava. – Já falei com ele para juntar as coisas, não agüento mais aquele homem parado; e todas pessoas no ônibus atentas à história. – O casamento serviu de lição para mim, argumentava Luci. Consola quase sempre calada, com movimentos de face alternados, assertivos e negativos. Quando falava, era com voz baixa, mas a despeito do nome Consola, não tentava consolar a amiga. Luci falava alto, com rigores nas descrições. – Outro dia desses cheguei em casa, fiz jantar, pintei cerâmica, faço tudo e Modesto parado.

Lucimara queria que Modesto fosse um homem engajado, afeto às atrações culturais de toda sorte, mas que, principalmente, a acompanhasse. Os dias de Desto na casa de Luci estavam contados. – Já falei tudo isto com ele, mas ele fica parado, não reage. Hoje ligou para mim: - Luci, meu amor, está com raiva de mim? – Não acreditei na coragem dele...ele não entende...- Acredita Consola? É um cara estranho...ninguém liga para ele e o convida para tomar uma cerveja...coisa estranha, não tem amigos...bem que eu notei desde o início...nunca se interessava por nada...nem sexo sabia fazer....mas ajudei e ele foi melhorando...agora não dá mais...não agüento mais! Consola se despediu e desceu antes da amiga. Luci seguia e pensava...Estava no limite de sua modéstia; os dias estavam contados.

Um comentário:

Anônimo disse...

Keilinha querida, so para dizer que sua escrita e tao delicada... e quem nao sabe ler portugues esta perdendo. Nossa lingua e tao bonita, que ateh faz o texto ficar melhor (ainda). Olha esta palavra: "modesto". Gosto muito.
Beijos e beijos, de Jerusalem!
Sabrina